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ENCONTRO DE MULHERES E LGBT | Estudantes da USP emocionam com performance sobre a opressão às mulheres

Neste sábado, dia 29 de agosto, aconteceu o emocionante Encontro de Mulheres e LGBT organizado pelo Grupo de Mulheres Pão e Rosas. E um dos momentos de inflexão do espaço foi a intervenção artística que mulheres da agrupação compuseram e apresentaram no sarau. A ideia da intervenção que mistura dança e teatro, linguagens que as mulheres envolvidas têm experiência, surgiu da necessidade de arrebatar aqueles que participassem do encontro também por outras vias da sensibilidade e de outros conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, como as artes cênicas.

quinta-feira 3 de setembro de 2015 | 03:29

Neste sábado, dia 29 de agosto, aconteceu o emocionante Encontro de Mulheres e LGBT organizado pelo Grupo de Mulheres Pão e Rosas. E um dos momentos de inflexão do espaço foi a intervenção artística que mulheres da agrupação compuseram e apresentaram no sarau. A ideia da intervenção que mistura dança e teatro, linguagens que as mulheres envolvidas têm experiência, surgiu da necessidade de arrebatar aqueles que participassem do encontro também por outras vias da sensibilidade e de outros conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, como as artes cênicas.

A temática do encontro suscita diversas discussões e sentimentos, os quais passam pelas formas como as opressões incidem sobre nós, mulheres e LGBT. Se na maioria das vezes vivemos sozinhas as opressões no nosso cotidiano, em espaços assim percebemos que não somos solitárias ao combatê-las. São milhões de mulheres e LGBT sofrendo com a opressão que acarretam desde traumas emocionais até mortes monstruosas e se nos organizamos para revidar num só punho contra os verdadeiros privilegiados, temos em nossas mãos a chance de acabar com as opressões e com todas as formas de exploração do homem pelo homem. O fato das opressões serem componente estrutural do sistema capitalista, que se apoia veementemente no patriarcado e na desumanização desses setores, orienta nosso combate não somente àqueles que reproduzem o machismo, racismo e lgbtfobia, sobretudo àqueles que de fato lucram com este tipo de divisão da classe trabalhadora: os grandes empresários e governos que os representam.

Mariana Vilas Boas, uma das responsáveis pela apresentação declarou: “Este singelo trabalho parte do esforço de trazer para o gestuário a forma como nós do grupo, subjetivamente, sentimos a opressão, ligando isto à dura realidade coletiva, como o trabalho precário, estupro corretivo, aborto e violência policial. E é por mecanismos de nossa sensibilidade tão pouco estimulados nesse mundo duro, como a arte, que (re)afirmamos, ainda que de forma inconsciente, o desejo de lutar contra todas as injustiças. A dança e o teatro tem um potencial subjugado pelas tradicionais formas de organização da esquerda, influência, na maioria das vezes, implícita do stalinismo e que precisam ser combatidas para elevarmos as ideias revolucionárias e os próprios revolucionários ao melhor que podem ser”.

Sobre relação entre a arte e a esquerda, a bailarina continuou declarando que: “O realismo soviético deturpou e reduziu a capacidade artística em mero panfleto, assim como retrocedeu o sonho de uma sociedade comunista em pleno uso de suas capacidades científico-tecnológica e moral. Tivemos um vislumbre no início da revolução de 1917 com tantos direitos aos setores oprimidos daquela sociedade. Precisamos de braços e pernas, de técnicas e práticas que, contraditoriamente, o capitalismo nos permitiu desenvolver e, ainda mais nesse cenário político econômico de crise em tantas esferas da vida humana, subversivamente. Essa sociedade já não pode nos conceder mais do que a ideia liberal de liberdade e, a arte acima de tudo, necessita passagem.”

Flávia Toledo também foi umas das participantes da intervenção e segundo ela: "O capitalismo nos oprime de muitas maneiras, e nosso corpo sente profundamente essa opressão. As extenuantes jornadas de trabalho destroem o corpo e impedem o desenvolvimento de suas potencialidades, moldando-o apenas para servir como ferramenta de produção. E aos setores mais oprimidos da sociedade o direito ao corpo na sua plenitude é ainda mais atacado. Que menina nunca ouviu que deveria "fechar suas pernas"? Qual de nós nunca teve de alterar sua postura para ficar mais "feminina", ou não teve suas habilidades podadas ao não poder sair correndo ou jogar bola por ser "brincadeira de menino"? Pouco a pouco, somos ensinadas a construir um corpo ideal que nos fragiliza e acua. Nessa pequena intervenção que nos colocou, também, em xeque, olhamos para nossas vidas e repensamos os efeitos da opressão cotidiana nos nossos corpos. E foi a partir deles, tão presos pela rotina, que pudemos colocar para fora tudo aquilo que a racionalidade não nos permite traduzir. A potencialidade que eu, atriz, encontro no teatro para expressar a minha maneira de ser no mundo serviu de combustível para, naquele sábado de fortes emoções, compartilhar com todas as minhas companheiras e todos os meus companheiros o que significa ser mulher nessa sociedade patriarcal e opressora. E a resposta que nós tivemos do "público" (que atuou conosco) comprova o que nos levou a organizar a intervenção: somos muito mais do que o capitalismo quer que sejamos, e rebelar-se contra esse sistema é também se livrar das amarras corporais e sentimentais que ele nos impõe."

Para Odete Cristina, que também participou da apresentação, “Poder expressar por meio da arte e do corpo tudo o que momentos antes debatemos e sentimos foi uma experiência incrível, sintetizar em uma nova linguagem discussões e sentimentos que fazem parte de nossa vida cotidiana é algo que nos marca profundamente. Faz parte de descobrir novas formas de tocar a pessoas e a arte cumpre um papel político fundamental. Com nossa performance queríamos retratar o que cada uma de nós sofria cotidianamente, mas que não era uma opressão individual e sim parte de uma sociedade que se apropria da nossa exploração e opressão para garantir seu lucro, que nos embrutece, tenta retirar a cada instante nossa sensibilidade e nossa humanidade. A ideia da performance era trazer a tona toda essa alienação produzida por esse sistema por meio de uma nova linguagem .”

Giovana Milhã também fez parte da apresentação e declarou ao Esquerda Diário que “Fizemos uma performance cuja finalidade era expor o cotidiano de milhares de mulheres. Quais mulheres? Em geral, as negras, lgbts e pobres. Estamos imersas no patriarcado e no racismo na sociedade capitalista. Este sistema se vale das opressões para nos explorar. Não temos direito aos nossos corpos. Nossas identidades são negadas. Apresentamos no encontro do dia 29 de agosto uma pequena cena buscando denunciar de maneira lúdica nossa realidade. É importante que usemos a arte como arma contra todas as opressões. Retratar um estupro corretivo e um aborto é muito doloroso, pois traz à tona aquilo que não é relatado pelos meios de comunicações de massa. Ao menos, não é relatado pelo ponto de vista das oprimidas, o que muda muito o caráter daquilo que está sendo abordado. Me orgulho muito de estar no Pão e Rosas e ter a oportunidade de, juntamente com minhas camaradas, vislumbrar uma nova sociedade, onde seremos de fato livres”.

Em depoimento Gabriela Farrabrás , outra participante da apresentação nos contou que “Me organizar politicamente junto ao Movimento Revolucionário de Trabalhadores e ao Grupo de Mulheres Pão e Rosas aumentou em mim um sensibilidade de notar e sentir diversas opressões e explorações que os capitalistas nos impõe, e que são invisibilizados e naturalizados. Essas opressões e explorações agem diariamente sobre nós, atingindo mais profundamente as mulheres trabalhadoras, negras e LGBT. Constatar isso é constatar o óbvio, mas ter um espaço como foi o Encontro de Mulheres e LGBT, para discutir isso é de uma raridade tão imensa, que temos que celebrar o que foi o dia 29 de agosto. Quando tivemos a ideia de nos apresentar no Encontro buscando uma arte revolucionária, entre a dança e o teatro, que pudesse sensibilizar a todos dessas questões, por si só tão sensíveis, buscamos em nós como essas opressões e explorações chegam a superfície de nós todas; quando não é mais possível guardar calada internamente, e em movimentos ansiosos, descontrolados e caóticos se apresentam.A ânsia, a inquietação, o choro calado ou gritado, a diminuição de si mesmo para querer desaparecer. O esforço repetitivo do trabalho precário e as dores, que nos seguem a todo o tempo, no caminho pra casa no sacolejar do trem onde somos expostas ao abuso sexual. O estupro corretivo onde dizem mais uma vez que não somos donas do nosso desejo, nosso querer e nosso corpo. O aborto clandestino que mata tantas Jandiras. A violência policial que arrasta Cláudias agonizantes pelo asfalto. São todas cenas de um sistema que nos sufoca e nos derruba, a todas, que só juntas conseguiremos resistir. Não há saída individual e o inimigo é apenas um: o sistema capitalista sustentado pela burguesia, que só a classe trabalhadora pode derrotar. Foi isso o que buscamos passar através da nossa arte”.

E para concluir ela declarou que “Encontrar depois de cantar junto as minhas camaradas, que “minhas companheiras também vão voltar”, depois de ouvir os aplausos, diversas pessoas com os olhos marejados de lágrimas nos abraçando, agradecendo e nos parabenizando pela apresentação me deu mais uma vez a certeza que o Pão e Rosas tem organizado e atraído pessoas sensíveis e com sede de mudança ao lado das quais não quero apenas lutar, mas construir as bases para uma nova sociedade, mais justa, sensível e equilibrada.”

Confira abaixo o vídeo da performance:

https://www.youtube.com/watch?v=pAX3sfNC4Q8&feature=youtu.be




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