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VENEZUELA | A direita venezuelana assume com ameaças destituintes

A ascensão de 167 novos deputados ocorreu nesta terça-feira (5) na Câmara da Assembleia Nacional. O quadro em que se abre esse novo período parlamentar é de uma crise econômica e social que entra com vigor em seu terceiro ano, marcada também por disputas entre a maioria opositora no Parlamento e o TSJ pela impugnação de quatro candidatos opositores eleitos no último 6 de dezembro, o que garantiria à oposição importantes atribuições legislativas próprias dos dois terços, no lugar das competências correspondentes a uma maioria de três quintos, aumentando a crise do Estado, como se antecipou neste artigo prévio às eleições.

Humberto ZavalaVenezuela | @1987_zavala

quinta-feira 7 de janeiro de 2016 | 00:08

Sem credenciais 4 deputados eleitos pela oposição

O primeiro episódio de tensões na Câmara, que ocorreu pouco antes de começar a cerimônia de posse, tem relação com o ocorrido quando o deputado do PSUV Pedro Carreño, que integrava a comissão para a revisão das credenciais, declarou que “dos 167 parlamentares, só 163 têm credenciais”. Para o ex-presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello: “Nenhuma decisão que tomem esses parlamentares tem validade”. Enquanto a primeira dama e deputada Cilia Flores declarou através de sua conta de Twitter “Hoje conseguimos impor a sentença do TSJ, fizemos respeitar o Poder Judiciário”, a maioria opositora acusou a decisão do TSJ de ser “ilegal”.
No último 30 de dezembro, uma carta aberta assinada por membros do Parlamento uruguaio, que participaram na condição de acompanhantes dos comícios de 6 de dezembro, manifestava o rechaço às impugnações: “pedimos dos Organismos Internacionais e Regionais, como é o caso da OEA, UNASUR e MERCOSUL, uma atenção imediata antes que seja tarde para a institucionalidade de um País Membro”, e o início imediato de uma “troika” para pressionar o governo de Maduro.

Lei de Anistia e Referendo Revogatório “inegociáveis” para a MUD

A decisão do presidente recém-juramentado da Assembleia Nacional, Henry Ramos Allup da Ação Democrática – MUD [Mesa de la Unidad Democrática, coalizão da oposição - NT], de permitir o direito à palavra ao parlamentar Julio Borges (Primeiro Justiça – MUD) foi o que marcou a retirada da bancada governista. Diosdado Cabello disse: “O senhor Ramos Allup pode ser muito bom advogado; não se trata de um acesso de raiva, nós fizemos uma queixa formal. Não se pode dar direito à palavra a ninguém mais, é só a posse”. Em resposta o novo presidente do Parlamento assegurou que essa retirada se devia a que a bancada governista “não quer escutar o que estou a dizer aqui”.
Os três principais anúncios de gestão parlamentar realizados pelo presidente da Assembleia Nacional, Ramos Allup foram: “Recuperar a autonomia do poder Legislativo”, “aprovar uma Lei de Anistia para os presos políticos”, e “um sistema para trocar o governo por via constitucional em um prazo de 6 meses” referindo-se ao referendo revogatório, medidas que foram reiteradas no mesmo discurso agregando “estes compromissos não são negociáveis”. Estes anúncios, como se afirmou em um artigo anterior para esse diário: “prenunciam um verão quente em uma Venezuela assolada pela crise econômica e social”.
O presidente Maduro cumpre em abril a metade de seu mandato, e é por isso que sem mais delongas Ramos Allup anuncia que continuarão a utilizar os recursos que tiverem em seu poder para introduzir o referendo revogatório. Esta mensagem vai em consonância com o que observamos durante as últimas sessões da Assembleia Nacional com maioria chavista, quando a mesma mensagem da MUD se expressava “desafiadora” em Ramos Allup e com uma pose “contemporizadora” de Julio Borges, que abordou no discurso que provocou a retirada da bancada governista os “temas sociais”: lei de cesta básica de alimentos e remédios para aposentados, lei de titularidade para os beneficiários da Missão Moradia, etc. Mas o central de tudo isso é que se abre um processo destituinte no país, de onde a direita busca a saída de Maduro o quanto antes.
O recado da MUD, ao eleger como presidente da Assembleia Nacional a Henry Ramos Allup por cima de Julio Borges, ficando esse último sem nenhum cargo de direção na nova Assembleia Nacional apesar de seu partido Primeiro Justiça conseguir o maior número de deputados (33) e contando com o apoio de outros 16 deputados, deixa implícitas as divisões ainda presentes dentro da MUD, e a combinação de medidas sociais demagógicas na boca de Borges e o plano destituinte por via do referendo revogatório anunciado por Ramos Allup, assegura que prevalece a agenda de confronto da oposição.

Uma “nova” Assembleia Nacional presidida pela velha direita

Quem assume como novo presidente da Assembleia Nacional - e sucessor do deputado PSUVista Diosdado Cabello - é o septuagenário Henry Ramos Allup, secretário geral do partido Ação Democrática (AD), deputado ao Parlamento Latino-americano desde 2011 e vice-presidente da Internacional Socialista (formada por partidos social-democratas de direita) desde o XXVI Congresso celebrado em 2012.
Parlamentar de velha data, sendo 4 vezes deputado no velho Congresso da Republica (hoje Assembleia Nacional). Em 1992, após o falido golpe militar de Hugo Chávez, encabeçou como deputado a petição para que se suspendessem as mais elementares garantias democráticas do país, instrumento que serviu ao governo de Carlos Andrés Perez para aumentar a repressão contra as mobilizações e lutas do povo trabalhador.
Entre 1996 e 1998 acompanhou como deputado a preparação da execução da neoliberal Agenda Venezuela, depois como parlamentar opositor ao governo de Chávez em 2000 até a famosa retirada da oposição nas eleições parlamentares de 2005, com o boicote contra o CNE, em 2010 volta a se eleger deputado pela Assembleia Nacional e é reeleito neste 6 de dezembro de 2015.
Eleito para presidir a atual Assembleia Nacional com 62 votos (dentre os partidos Vontade Popular, Um Novo Tempo, Aliança Bravo Povo e Vente Venezuela) contra 49 de seu oponente - no interior da MUD - Julio Borges, do partido Primeiro Justiça, apoiado também pelo movimento Progressista, com um total de 111 votos contados. Na mensagem de agradecimento Henry Ramos reconheceu "a qualidade e estirpe" de seu "opositor", e por vezes aliado em políticas reacionárias, Julio Borges.
Uma "nova" Assembleia Nacional presidida por um velho membro da AD se converte, paradoxalmente, junto com a crise econômica e social, em parte do legado dos últimos 17 anos, produto do esgotamento do modelo político e econômico do chavismo e a incapacidade deste para satisfazer as principais demandas e aspirações do povo trabalhador herdadas da crise do “puntofijismo”.
Por esta razão, frente aos futuros conflitos que anunciam maiores ataques contra o povo trabalhador - pois com o governo nacional e Poder Legislativo nas mãos da direita só se fala de ajustes para sair da crise econômica - é fundamental que a classe trabalhadora e o povo pobre se preparem e se organizem de forma independente para enfrentar tais ataques que só farão aumentar os sofrimentos que já os atingem.




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