IdE: Na próxima terça-feira, dia 9, vai ocorrer o lançamento do livro “A Internacional Comunsita depois de Lênin – Stálin, o grande organizador de derrotas”, de Leon Trótski, organizado pela Edições Iskra no youtube do Esquerda Diário, do qual você irá participar. Poderia nos dizer, na sua opinião, qual a importância desse livro para o momento que vivemos, em especial para o combate ao stalinismo, e como apropriação crítica para a atuação da luta de classes?
Purdy: Esse estudo é super importante como guia para quem quer entender a virada antimarxista da política stalinista na URSS nos meados da década de 1920. A Internacional Comunista (IC) no tempo de Lênin fez erros, mas era uma organização séria e dedicada à revolução mundial. A adoção do conceito de “socialismo em um só país” por Stalin e sua corja fez com que a IC se tornasse simplesmente um órgão da política externa stalinista. Essa concepção continua tendo efeitos até os dias de hoje: partidos influenciados por stalinismo hoje em dia não combatem imperialismo como um todo, mas escolhem qual é o melhor imperialismo. Então, apoiam Rússia, China, Síria, etc. porque são contra imperialismo norte-americano mesmo que esses países também são propriamente imperialistas ou aliados aos países imperialistas. O resultado é que a luta de classes dentro desses países imperialistas é ignorada, ou pior, partidos stalinistas acabam tomando o lado do governo e os patrões contra a classe trabalhadora nesses países, apoiando repressão contra movimentos populares. Entender as origens dessa história, como esse livro propõe, nos ajuda atuar nos tempos de hoje.
IdE: Pensando no desenvolvimento do capitalismo nos EUA, qual seria, na sua opinião, a importância neste país, que é o coração do imperialismo, para a luta dos trabalhadores internacionalmente, ontem e hoje?
Purdy: A luta de classe nos EUA é absolutamente central às lutas socialistas internacionais. É obviamente um enorme desafio, mas se queremos construir uma revolução internacional seria necessário a contribuição dos trabalhadores dentro do maior país imperialista do mundo. Há bons sinais recentemente com várias lutas importantes nos EUA. É nosso dever apoiar completamente às lutas nos EUA justamente como é o dever deles apoiar nossas lutas aqui no Brasil. A classe trabalhadora é internacional e nossas lutas também.
IdE: Ainda, como consequência da crise do capitalismo, vemos uma aproximação por alguns setores, em especial os jovens, às ideias comunistas, junto a isto, há novas tentativas de reabilitação de Stálin por parte de alguns setores ditos do movimento comunista. Como você enxerga esta reabilitação e como desmascará-la?
Purdy: Creio que a adoção de ideias stalinistas – uma distorção de marxismo e da tradição socialista – resulta de um fator principal: no contexto da acelerada exploração e opressão de capitalismo atual, algumas pessoas, especialmente jovens, buscam um passado imaginário quando socialismo supostamente era forte e constituía uma real alternativa ao capitalismo. O problema é que a URSS desde o fim da década de 1920 não era um estado socialista dedicado à revolução nesse país nem internacionalmente. Sob Stalin e seus tenentes, as possibilidades emancipatórias da Revolução Russa de 1917 foram esmagadas através da construção de uma burocracia repressora e antidemocrática que não representava os interesses dos trabalhadores, mas sim de uma casta burocrática que fazia tudo para se manter em poder. Há muito debate sobre a exata natureza e características da URSS, China e seus satélites, mas o que importa é que não eram/são socialistas. O objetivo central da tradição marxista desde Marx e Engels – revolução internacional e a construção da democracia operária com valores socialistas – foi substituído por stalinismo, através de massiva repressão, com um estado forte, burocrática, antidemocrática e imperialista. Acredito que o único jeito para convencer gente do êxito sem saída de stalinismo que envolve mentiras descaradas e distorções de história é através de estudos e argumentos críticos e honestos sobre como foi esse processo e como tais políticas não nos servem hoje em dia seja numa greve contra os patrões ou em lutas contra intervenções imperialistas. Nesse sentido, sigo o marxista revolucionário italiano, Gramsci, que escreveu que temos que ter pessimismo do intelecto, mas também otimismo da vontade.
IdE: Um dos projetos com que tem trabalhado compara slums, guetos e favelas em São Paulo, Chicago e Toronto, o que tem percebido de semelhanças e diferenças entre esses espaços marginais dos distintos países que compara? Como o capitalismo contribui para o desenvolvimento destes espaços?
Purdy: Meu objetivo com esse estudo é para mostrar que mesmo com formas distintas e histórias locais diferentes há uma dinâmica capitalista semelhante no mundo inteiro no século XX em relação à marginalização dos trabalhadores pobres e também da sua resistência. O povo que eu estudo nesses espaços em vários países – pobres, negros, imigrantes, mães solteiras – são trabalhadores que foram marginalizados pela mídia, estado e a classe dominante. Nos últimos quarenta anos, importantes estudos antropológicos, sociológicos e em menor extensão, históricos, sobre os povoamentos de slums, guetos e favelas na América Latina e do Norte, disseminaram a noção de desorganização e isolamento social dos pobres nas cidades e de sua posição como “objetos” passivos da história. Apesar de se tornarem no imaginário público “espaços párias”, os moradores desses bairros e comunidades têm sido importantes na luta de classe. Precisamos lutar juntos com eles para avançar as possibilidades de revolução.
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