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Peru: o significado da dissolução do Congresso e o novo período que se abre

José Rojas

Peru: o significado da dissolução do Congresso e o novo período que se abre

José Rojas

Na última segunda-feira, 30 de setembro, o presidente Martín Vizcarra dissolveu o Congresso da República, de maioria fujimorista, inaugurando assim um novo período na crise orgânica que atualmente se vive no Peru. Essa medida faz parte de um conjunto de eventos que afetaram severamente a casta de políticos e de seus partidos mais importantes, como o APRA, o fujimorismo, o nacionalismo, o toledismo e um setor da esquerda reformista, que em um período relativamente curto viu seus principais líderes na prisão e até um deles - Alan García, do APRA - acabou se suicidando.

No entanto, parece-nos que o fechamento do Congresso, apesar de golpear duramente Fujimori e o APRA, não deixa de ser uma saída precária que ainda não resolve completamente o conflito entre essas duas frações da burguesia e que joga para adiante novas contradições. Isso se deve à debilidade do governo de Martín Vizcarra, que o leva - justamente por isso - a implementar esse tipo de medidas bonapartistas que visam obter apoio popular ao Executivo a fim de que este possa, agora através de decretos de emergência, aprofundar as políticas de ajuste econômico, que é a principal demanda das burguesias no continente diante do impacto da crise econômica internacional.

1.-Dissolução do Congresso: manobra do Executivo ou luta das massas

O fechamento do Congresso pelo Presidente da República também abriu uma discussão interessante com os setores reformistas e neo-reformistas da esquerda peruana, que consideram que esse fato representa em si mesmo uma vitória popular, a qual seria uma consequência da mobilização social e , portanto, deveria se dada a confiança e o apoio necessários ao governo de Martín Vizcarra e, assim, sustentar o processo de transição, que se tornaria um processo constituinte que permitiria alterar a constituição de 1993 e “recuperar o Estado para o povo ".

Embora o fechamento do Parlamento tenha sido muito bem visto pela grande maioria dos peruanos e na segunda-feira, 30 de setembro, em várias regiões do país, tenha havido manifestações de rejeição aos congressistas, isso está longe de ser considerada uma consequência de um processo da luta das massas, já que as massas há muito tempo deixaram as ruas devido à política de desvio da mobilização que o governo e seus aliados da esquerda reformista e neo-reformista vinham promovendo desde 28 de julho do ano passado, que estava orientada a que o povo acabe apoiando as diversas reformas políticas promovidas pelo presidente (como o referendo de dezembro de 2018 e a antecipação das eleições); as mesmas que demonstraram esterilidade e inoperância, é por isso que Fujimori e APRA recuperaram forças e foram para a ofensiva. Isso se expressou claramente na cooperação do Tribunal Constitucional e no arquivamento da proposta de antecipação das eleições, que previa a possibilidade de vacância presidencial e um maior endurecimento da política fujimorista, especialmente agora que as investigações sobre o caso Odebrecht (caso CODINOMES) começou a revelar os nomes dos políticos que receberam dinheiro da construtora brasileira, dentre os quais se encontravam muitos líderes do fujimorismo, APRA e das outras forças políticas que acabaram entrincheiradas no parlamento.

Esse processo de desmobilização foi acompanhado por uma rejeição social embrionária da administração de Martín Vizcarra, expressa concretamente na luta do povo de Tambo contra a mineradora Southern, que abriu outras lutas ambientais na parte sul do Peru, bem como na greve nacional da mineração. Tanto a luta do povo de Tambo (que continua até hoje) quanto a greve mineira confrontaram abertamente o governo de Vizcarra e despertaram a solidariedade de muitos setores populares em todo o país; apesar disso, o governo os reprimiu violentamente. Em Tambo e Islay, o governo ordenou a militarização e lançou uma campanha de criminalização dos protestos e repressão violenta contra os manifestantes, que terminou com dezenas de feridos e detidos, enquanto toda a direção da federação mineira foi detida por ordens expressas do Executivo, ignorando todos os protocolos legais e o “Estado de Direito”.

O fechamento do parlamento não foi então o resultado de uma grande luta popular - como foi a queda de Alberto Fujimori no final da década de 1990 -, mas representa uma manobra do Executivo que, amparado no que que estabelece a Constituição de 1993 ( neoliberal e autoritária) e no poder das forças armadas, das forças policiais, da grande mídia e do setor empresarial, acabou removendo a outra fração burguesa liderada por Fujimori e APRA que, além de das pontes de negociação estabelecidas por Vizcarra, decidiram apelar à sua força parlamentar para garantir a liberdade de Keiko Fujimori - agora na prisão - e a impunidade de seus líderes diante das investigações do caso Odebrecht. Essa manobra, no entanto, gerou muita popularidade, já que - como dissemos antes - é sustentada pelo grande descrédito de Fujimori, APRA e do resto dos partidos políticos que, até poucos dias atrás, manejavam à sua vontade o Parlamento peruano.

2.-Caráter da crise

Em vários escritos, estabelecemos, a partir da Corrente Socialista das e dos Trabalhadores - CST, que a atual crise no Peru - e que se iniciou há alguns anos a partir da revelação dos vínculos diretos de ex-presidentes e outros políticos com a corrupção promovida pela construtora Odebrecht - é uma crise orgânica que demonstra o esgotamento do modelo neoliberal, das instituições herdadas do regime de 1993 e dos partidos políticos (da direita e da esquerda reformista) que acabaram tornando-se abertamente correias de transmissão dos interesses dos grandes empresários.

Antonio Gramsci sustentava que as crises orgânicas se davam: “ou porque a classe dominante fracassou em algum grande empreendimento político pelo qual solicitou ou impôs à força o consenso das grandes massas, ou porque vastas massas (especialmente do campesinato e dos intelectuais pequeno-burgueses) passaram da passividade política para uma certa atividade e levantam reivindicações que, como um todo não orgânico constituem uma revolução. Fala-se de uma crise de autoridade e é precisamente a crise da hegemonia, ou a crise do Estado como um todo ”.

No caso peruano, embora as massas ainda não entrem em cena com seus próprios métodos e se tornem o fator decisivo - o que não significa que isso não ocorra mais tarde -, atualmente o que é inegável é o fracasso do "empreendimento político" chamado neoliberalismo, promovido pelos vários partidos políticos e seus principais líderes. O "empreendimento político" neoliberal é a base econômica sobre a qual se mantém todo o edifício legal do regime de 1993, que se tornou o principal escudo usado pelos empresários para promover a corrupção, a exploração do trabalho e o saque nacional. Isso levou precisamente a instâncias como o Poder Legislativo, o Poder Judiciário ou o próprio Executivo percam autoridade, levando-os a uma crise de hegemonia.

É precisamente para superar essa crise de hegemonia que a grande burguesia conta com personagens como Martín Vizcarra, para que, a partir do carisma e da popularidade gerada, possam contribuir para recuperar a legitimidade das instituições atuais e do Estado como um todo, para dessa maneira manter as relações de exploração e opressão. Por esse motivo sempre se insiste, na grande mídia e outros aparelhos reprodutivos da ideologia dominante, na ideia de que se deve reforçar as instituições e a probidade dos funcionários públicos e dos políticos para que, por dentro do Estado e das Instituições, se acabe com a corrupção. Esse discurso procura, na realidade, levar o mais longe e pelo maior tempo possível às massas da política (entendida essa como ação direta e luta de classes), criando assim expectativas nas figuras providenciais e bonapartistas e no melhor dos casos nos processos eleitorais que sempre acontecem sob a lógica do grande capital e do mercado.

E dizemos que no Peru o neoliberalismo fracassou porque este - que na época era oferecido como a única possibilidade de progresso e desenvolvimento - foi incapaz de desenvolver as condições mínimas de subsistência digna para as grandes maiorias exploradas e oprimidas, embora em nosso país, entre 2002 e 2013, houve um período significativo de crescimento econômico como resultado do boom de matérias-primas (alcançamos um crescimento anual de 8%). Hoje, imerso no turbilhão da crise econômica internacional, nossa economia caiu significativamente (crescimento de 2%) e não há sinais de solução. Por esse motivo, a burguesia é forçada a redobrar seus mecanismos de exploração por meio de políticas de ajuste como as que o governo de Vizcarra implementou até agora. Isso levou a que novas lutas populares e dos trabalhadores comecem a emergir - ainda de forma embrionária - no campo social, como recentemente expressou a luta do povo de Tambo contra a empresa de mineração Southern ou a greve nacional da mineração, que faz parte de um processo de despertar do movimento dos trabalhadores da mineração que, com seus altos e baixos, começou a lutar nacionalmente desde 2017, como resultado do impacto no Peru da crise econômica internacional.

Isso implica que foi aberta uma nova etapa no Peru que, devido à profundidade de suas contradições, a burguesia não pode fechar sem grandes crises, que podem durar vários anos e incluir diferentes momentos de política e luta de classes, com situações de estabilidade circunstancial, outras pré-revolucionárias ou revolucionárias, e também tentativas de saídas bonapartistas de direita. E é precisamente a este último que o atual governo de Martín Vizcarra aponta, como veremos abaixo.

3.-Caráter do governo

O governo de Martín Vizcarra é um governo a serviço dos grandes empresários nacionais e estrangeiros e do imperialismo norte-americano. Por esse motivo, quando a crise eclodiu em 30 de setembro devido à dissolução do Parlamento, o governo não apenas teve o apoio explícito das forças armadas como um todo, a alta liderança da polícia nacional, mas também a embaixada dos EUA se pronunciou abertamente a favor do presidente. Este último foi claramente evidenciado em um comunicado divulgado na última terça-feira, 1º de outubro, pelo porta-voz da embaixada ianque no Peru, onde ele estabeleceu que “os EUA apoiam as instituições democráticas do Peru e continuarão como parceiros na democracia. ”

Cabe recordar que Vizcarra chegou ao governo em março de 2018 como resultado de uma grande crise política que forçou a renúncia do então presidente Pedro Pablo Kuczynski, que anteriormente havia dado indulto ao preso Alberto Fujimori. Vizcarra veio precedido por uma gestão como presidente regional de Moquegua, caracterizado por seu relacionamento próximo com a empresa de mineração Southern, o que o levou a vincular-se aos círculos mais íntimos do grande empresariado da mineração. Durante os primeiros meses do governo de Kuczynski, Martín Vizcarra assumiu a responsabilidade pelo Ministério dos Transportes e Comunicações, razão pela qual está vinculado ao manuseio incorreto na licitação do trabalho do aeroporto de Chincheros em Cusco.

Já como presidente da República, Martín Vizcarra vem implementando em conjunto várias iniciativas em favor do grande capital, bem como as recomendações de agências financeiras internacionais que levam à redução dos gastos públicos estatais. Por isso, no ano passado, promoveu a eliminação da negociação coletiva para os trabalhadores do setor público, um golpe para esse setor que não pode mais exigir aumentos salariais no momento em que as taxas de inflação aumentam. Da mesma forma, sua administração presidencial tem sido responsável pela promoção e aprovação de importantes medidas anti-trabalhistas e do setor privado, como o Plano e Política de Competitividade e Produtividade, que corta uma série de direitos aos trabalhadores e promove a privatização das poucas empresas públicas de serviços ainda em vigor, como as empresas que fornecem serviços de água e eletricidade que em breve serão vendidos para capitais privados estrangeiros. A última em questões pró-patronal do Presidente Vizcarra foi a extensão, até 2031, dos benefícios tributários e trabalhistas aos grandes empresários de agroexportação, que dessa maneira podem continuar a sonegar impostos ao Estado e a explorar em excesso os mais de 350 mil trabalhadores que dependem desta atividade econômica. Vale ressaltar que todas essas medidas, às quais se soma o congelamento do orçamento público de setores como educação e saúde, puderam ser realizadas por Vizcarra, porque no Parlamento ele sempre teve o apoio da bancada fujimorista.

Vizcarra também se fez de surdo às demandas do povo do Vale do Tambo, que há muito se opunha à instalação do projeto Tía María, por isso não hesitou em conceder a licença de construção desse projeto, pertencente à mineradora Southern. Para concretizar os interesses do grande capital, o presidente em exercício apelou à repressão aberta e dura contra os setores sociais que resistem a suas políticas; para isso, ele militarizou a província de Islay e ordenou uma forte repressão policial contra os camponeses de Tambo, que, como dissemos, até agora custaram dezenas de detidos e feridos. O mesmo proceder repressivo se deu com a greve mineira, que ele reprimiu ferozmente e acabou prendendo injustamente todos os seus líderes. A isso se soma a criminalização do protesto social promovido desde a sua administração: teve sua expressão mais emblemática na prisão do governador regional de Puno e ex-líder social Walter Aduviri, a quem o Estado abriu o processo e acabou sentenciando pela participação em uma luta popular contra a mineração em 2011.

Para implementar todas essas medidas, o presidente se valeu de seu véu de lutador contra o fujimorismo e a corrupção. Este, apesar de ser um governo de direita não estabelecido, permitiu a ele oxigênio suficiente devido ao grande descrédito desse setor da casta política que no Parlamento mostrou a ação política mais vil. Portanto, a dissolução do Parlamento compensa o fortalecimento de sua figura e seu peso político diante do povo. Isso, sem dúvida, o permitirá pisar fundo no acelerador das reformas pró-empresariais em um cenário em que a burguesia que o sustenta precisa ir por mais e o poder político agora se concentra na figura presidencial, já que, até que se eleja o novo congresso, o Peru será governado por decretos de emergência promovidos pelo presidente.

4.-O papel do reformismo, do neo reformismo e das grandes centrais dos trabalhadores

Os setores reformistas e neo-reformistas liderados pelo Novo Peru de Veronika Mendoza, o Partido Socialista, o Partido Comunista da Unidade e o Partido Comunista Vermelho Patriótico, que vinham apoiando o governo de maneira implícita, após a dissolução do Parlamento passaram a cumprir um papel mais aberto e explícito em relação ao seu apoio ao governo. Quem melhor evidencia isso é Veronika Mendoza, do novo Peru, que em um meio de comunicação fez um chamado público para formar um governo de transição, juntamente com o Presidente Vizcarra, que lhes permita avançar no sentido de mudar as regras do jogo e abrir as possibilidades de um processo constituinte. ; da mesma forma, Mendoza colocou seus técnicos e profissionais a serviço do novo governo.

Essa proximidade com o Executivo dessa esquerda não é nova, data do segundo turno das eleições presidenciais de 2016, quando esses setores e as centrais sindicais convocaram para votar no PPK porque, segundo eles, “ele era um tecnocrata eficiente e ético”, e Keiko Fujimori representava a ditadura dos anos 90 e daria o indulto a seu pai Alberto Fujimori. Essa esquerda endossa a lógica do "mal menor"; portanto, longe de ter uma política de independência de classe contra os dois setores neoliberais, eles decidiram apoiar o PPK. O apoio de Kuczynski não terminou aí, mas ele o acompanhou por grande parte de seu mandato, por isso, quando em 2017 ocorreram as grandes greves de professores a partir das bases em que eles acabaram tirando a burocracia da SUTEP (ligada à Pátria Vermelha) e as greves dos trabalhadores da grande mineradora de Cerro Verde ou Southern, a direção desses setores da esquerda tinha uma postura pró-patronal e altamente reacionária. Tempos depois, o PPK se esqueceu de seus aliados que votaram nele e o apoiaram no governo e decidiu dar o indulto a Alberto Fujimori em 24 de dezembro de 2017, em meio às alegações que o vinculavam à corrupção da empresa Odebrecht quando ele era ministro da Justiça de Toledo.

Assim, foi aberta uma profunda crise política, com várias mobilizações que se opunham ao perdão de Alberto Fujimori e questionavam o financiamento de diferentes políticos pela construtora brasileira. Esse cenário forçou o PPK a renunciar e, em 23 de março de 2018, assumiu Vizcarra, que em 28 de julho do mesmo ano muda sua estratégia e enfrenta Fujimori. Nesse sentido, ele anuncia em sua Mensagem à Nação a realização de um referendo sobre quatro pontos para fazer uma reforma constitucional e, assim, salvaguardar o regime dos 93 e fortalecer a institucionalidade herdada da ditadura dos anos 90.

Essa nova postura de Vizcarra levou esses setores da esquerda malmenorista a se alinharem com o executivo sob a lógica de que se deveria combater Fujimori e recuperar a institucionalidade democrática, para isso não "hesitaram em fazer campanha pelo referendo, cujos resultados favoreceram a proposta do Executivo, aprovando a não reeleição imediata de congressistas, a reforma do Conselho Nacional da Magistratura, a regulamentação do financiamento privado de partidos políticos e o retorno à bicameralidade. Isso levou a que a popularidade presidencial subisse consideravelmente, o que permitiu ao Executivo implementar uma Reforma Trabalhista adaptada aos interesses dos empregadores que não tiveram oposição real no CGTP, CUT ou em outras centrais sindicais, porque estavam totalmente alinhados com Vizcarra Essas reformas, no entanto, acabaram sendo apenas cosméticas, uma vez que não impediram os empresários de financiar partidos políticos, e o tão anunciado Conselho Nacional de Justiça, que substituiu o Conselho Nacional do Judiciário, ainda não pôde ser constituído. O que essas medidas alcançaram foi desmobilizar as pessoas e inocular a ideia de que, com Vizcarra no comando e de dentro da estrutura institucional, a corrupção poderia acabar.

Quando Vizcarra deu sua segunda mensagem à nação em 28 de julho passado, o conflito estava ocorrendo no vale do Tambo, o que acabou desencadeando outros conflitos contra o governo e a mineração na parte sul do país; do mesmo modo, a greve nacional de mineração já foi anunciada; então o presidente não teve ideia melhor do que anunciar a antecipação das eleições para 2020. Essa iniciativa, mais uma vez, foi aplaudida e apoiada pela esquerda reformista que esqueceu a luta do povo de Tambo, a greve de mineração e a outras lutas em andamento e concentraram a atenção na possibilidade de antecipar as eleições, até que Fujimori terminou o processo e Vizcarra se refugiou na defesa da autonomia do Tribunal Constitucional, sempre com o apoio solícito desse setor de esquerda.

E enquanto esses setores acabavam marchando atrás das iniciativas do Executivo, o Presidente Vizcarra militarizou Islay, reprimiu Tambo e aprisionou os trabalhadores da mineração e, juntamente com Fujimori, aprovou iniciativas como o Plano e a Política de Competitividade e Produtividade que favorece empreendedores ou a extensão dos benefícios aos grandes empresários agroexportadores.

5.-Por uma saída dos trabalhadores e do povo

Pelas razões mencionadas, afirmamos que o governo de transição de Vizcarra e seus aliados não representa uma alternativa para o povo e os trabalhadores, portanto, não tem nada de progressista - como o reformismo e o neo reformismo sustentam -, mas pelo contrário: será pelas mãos deste governo que a burguesia nacional e estrangeira tentará implementar mais medidas para ajustar às grandes maiorias, como vinha fazendo até agora. Portanto, não depositamos a menor confiança no Executivo e fazemos um chamado a que os trabalhadores recuperem sua independência política e se organizem fora do governo, exigindo das direções das grandes centrais operárias do país a preparação e a subsequente realização de uma grande greve nacional que nos permita deter a privatização dos serviços de água e eletricidade, a poluição ambiental de empresas de mineração como a Southern, a redução dos direitos dos trabalhadores, entre outros pontos que, em resumo, evitem que as consequências da crise internacional acabem sendo pagas pelo povo e os trabalhadores.

Nós que nos reivindicamos socialistas revolucionários temos consciência de que as demandas genuínas do povo e dos trabalhadores só podem ser alcançadas através de um governo operário que rompa com a burguesia, o imperialismo e seu Estado. Portanto, a ideia promovida por alguns setores da esquerda nos parece reacionária, no sentido de fazer as pessoas acreditarem que o Estado é neutro e que a grande tarefa da esquerda hoje é unir-se para fazer parte da gestão desse Estado e que "por dentro" podemos transformá-lo para o benefício de todos. Essas abordagens não são apenas utópicas e desprovidas de qualquer base científica - já que não conhecem o caráter de classe da sociedade -, mas também a história mostra que, onde foram aplicadas, levaram apenas a grandes derrotas e frustrações que terminaram gerando o retorno dos setores mais conservadores ao poder.

No entanto, também temos consciência de que, para avançar em direção a esse governo dos trabalhadores e das grandes maiorias exploradas e oprimidas, as massas trabalhadoras precisam elevar seu nível de consciência e organização política; por isso, consideramos que, neste momento, é necessário lutar por uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, nascida das ruínas do antigo regime de 1993 e baseada na mobilização e auto-organização dos trabalhadores e do povo.

Somente uma constituinte dessa natureza permitirá que as massas exploradas e oprimidas façam sua experiência nos limites da democracia burguesa e avancem no processo de organização de um duplo poder capaz de confrontar em seu momento o Estado e suas instituições que servem apenas aos empresários e a casta de políticos corruptos. É por isso que esse processo constituinte, se realmente queremos que seja democrático, não podemos esperar que nasça das mãos de um governo de empresários, nem como consequência da atual institucionalidade política que emana do regime de 93, que é altamente antidemocrático e único. Favorece os ricos e poderosos como sempre. Fazer isso invalidaria a natureza progressiva da constituinte e a tornaria refúgio da reação, em outra forma de desvio da mobilização social ou em uma mera reforma do Estado.

Uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana imposta pelos métodos da luta de classes deve ter funções legislativas e executivas. Lá poderemos escolher nossos representantes através de um distrito eleitoral único, para que não possam diluir o peso das grandes concentrações urbanas, para começar a anular todas as reformas anti-trabalhistas impostas por Fujimori, Toledo, García, Humala, PPK e Vizcarra. Lá também podemos lutar pelo fim dos pagamentos da dívida pública, pela nacionalização dos recursos naturais, pela reestatização e estatização sob administração e controle democrático dos trabalhadores e do povo de todas as grandes empresas estratégicas do país, que os juízes e os promotores sejam eleitos por eleições universais; da mesma forma, que os políticos eleitos pelo voto popular ganhem o mesmo salário que um trabalhador qualificado e, se não cumprirem o mandato para o qual foram eleitos, possam ser revogados, do presidente para baixo.

Como já dissemos, acreditamos que essa experiência contribuirá para os trabalhadores, os camponeses, os setores humildes e despossuídos, os povos indígenas, entendem que a única solução para todos os problemas é através de um governo de trabalhadores de ruptura com o capitalismo que, apoiando-se nos organismos de auto-organização dos trabalhadores e do povo, com base na democracia direta, avance decididamente e confrontando o imperialismo e inicie a luta por uma sociedade sem explorados ou exploradores.


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[Teoria]

José Rojas

Militante da Corriente Socialista de las y los Trabajadores "CST" do Peru
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