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Alianças com a direita | A viagem de Lula por Pernambuco

O estado natal do ex-presidente foi o primeiro escolhido para sua “turnê” no Nordeste. Aqui analisaremos um pouco mais como foi a passada de Lula pelo Estado.

sábado 21 de agosto de 2021 | Edição do dia

A escolha de Pernambuco como primeiro estado não foi à toa. Apesar de em seu discurso presidencial alegar que fez isso por ser sua terra natal, na verdade os objetivos eram bem mais políticos que isso. O estado é o bastião do PSB e do clã Arraes-Campos, que lidera o partido há mais de uma década. Antes aliados históricos, desde 2012 que as relações entre os dois partidos andam meio tensas. Em 2014 Eduardo Campos se lançou a presidência e as pesquisas apontavam que ficaria em 3º lugar. Após Marina não conseguir o registro do seu partido Rede a tempo, assume como vice na chapa de Campos, que morre em um acidente de avião em agosto. Marina acaba as eleições em 3º com 21% dos votos e logo depois declara apoio à Aécio no segundo turno.

As relações ficam ainda mais tensas quando o PSB apoia o golpe de 2016. Em 2018 se reconciliam, com o PT nacional desautorizando a candidatura de Marília ao governo do estado para apoiar o candidato do PSB, em troca do apoio nacional. Em 2020, Marília consegue o apoio da direção nacional para ser candidata a prefeitura do Recife enfrentando seu primo João Campos – contra a vontade de boa parte da direção estadual do partido que preferia apoiar o PSB. João Campos ganha a eleição no segundo turno numa campanha marcada pelo uso de métodos bolsonaristas de fake News pelo PSB. Esse ano, o partido está dividido de novo, com Marília pleiteando a candidatura do governo do estado.

Ao mesmo tempo o PSB recebeu nos últimos tempos alguns nomes importantes: o deputado federal Marcelo Freixo e o governador do Maranhão Flávio Dino. Em 2018 o partido também tinha sido o destino de Alessandro Molon, deputado mais votado da coligação petista no Rio em 2014. A divisão interna não é exclusividade do PT: o PSB também se encontra cindido em duas alas, uma que defende apoiar Lula desde já (tendo como um dos grandes porta-voz o governador Paulo Câmara) e outra que defende que o momento de decidir isso não é agora e negocia ainda uma possibilidade de terceira via (na qual se inclui João Campos). Mas não nos enganemos, não se trata de nenhuma “divisão de princípios” desse partido que já mostrou que é capaz de apoiar medidas ultrareacionárias como o golpe de 2016. Se trata apenas de uma discussão de qual a melhor estratégia para ter cargos num futuro governo eleito em 2022 (seja do PT ou seja de uma terceira via neoliberal) e também como eleger mais parlamentares e governadores.

Com a intenção de tentar pacificar a disputa interna nos dois partidos e garantir o apoio à sua candidatura em 2022 é que Lula deu prioridade ao estado (que aliás foi o que ficou mais dias nessa primeira “turnê”). Segundo o Jornal do Commercio Lula teria dito numa reunião reservado que estaria disposto a abrir mão de uma candidatura própria. Ao mesmo tempo, Marília teria declarado que não seria um impeditivo a uma aliança com o PSB, mas apresentou pesquisas eleitorais que dizem que ela ganharia a eleição. Logo que desembarcou no domingo (15), foi a um jantar com o PSB no Palácio das Princesas. Após o jantar, onde ficou marcado pela foto que ilustra esse artigo, com Lula, Paulo Câmara e João Campos, o governador disse que o Brasil precisava de uma frente ampla, enquanto o prefeito do Recife afirmou que o debate eleitoral só deve ser ano que vem.

Além do PSB, Lula também se encontrou com representantes da direita tradicional como o MDB – lembrando que o MDB do estado abriga o líder do governo Bolsonaro no Senado Fernando Bezerra Coelho –, o PP do líder do governo no Congresso Ciro Nogueira e até mesmo o Republicanos, mesmo partido de Carlos Bolsonaro. Com isso Lula mostra que sua estratégia continua a mesma de tentar se aliar com a direita mais asquerosa, a mesma que deu o golpe de 2016 e hoje é inclusive base de Bolsonaro. Essa estratégia de “disputar” a direita fica claro em seu discurso no Piauí na quarta, onde afirmou que acredita que Ciro Nogueira romperia com Bolsonaro.

Após costurar alianças com o PSB e a direita mais asquerosa, Lula se reuniu com o PCdoB e com o PSOL. O primeiro já é um antigo aliado e apoia todas as políticas de aliança com a direita que Lula faz há tempos. O segundo, sob um pretexto de combater Bolsonaro, vem mostrando sua total adaptação ao PT e Lula, com sua política de alianças com a direita. O discurso que reproduzem de que “o diálogo é importante” não faz nada mais do que endossar a política petista de se aliar com toda a direita que promoveu o golpe de 2016 e todos os ataques como a reforma trabalhista e da previdência e que inclusive são base de sustentação do governo Bolsonaro hoje.

Para terminar Lula deu uma coletiva de imprensa e depois um discurso aos movimentos sociais onde o conteúdo foi parecido. Com um discurso demagógico de que está disposto a “reconstruir o país” e trazer dignidade aos trabalhadores e aos pobres. Para isso disse que a receita é “simples” é apenas “botar o pobre no orçamento” e dizendo que “já fez isso antes”, tentando evocar a memória do tempo do seu governo.

Ainda que o governo de Lula tenha dado algumas concessões, que na região Nordeste foram sentidas mais fortes, quem ouve o discurso de Lula achava que durante o seu governo o Brasil atingia padrões de vida “suecos”. Ainda que com o tamanho do desmonte promovido pela direita e extrema direita após o golpe, o discurso de Lula possa ter bastante apelo, a verdade é que mesmo essas frágeis concessões - que foram dadas no momento em que toda a América Latina passava por um período de crescimento com a boom das commodities - foram retiradas com a crise econômica, principalmente no segundo governo Dilma com o ajuste fiscal promovido pelo Ministro Joaquim Levy. O golpe, com o teto de gastos, as reformas e as privatizações a toque de caixa agravaram ainda mais a situação.

E é aí nesse quesito que mora o “x” da questão. Apesar de Lula bravar contra a ofensiva golpista e a Lava Jato, mas trata a questão quase que de forma pessoal. Diz que apesar de toda a injustiça feita contra ele, conseguiu provar sua inocência e que “não guarda rancor”. Esse discurso bonito por fora na verdade tem como objetivo legitimar todas as pactuações com golpistas e com a direita que até a eleição só tendem a se aprofundar. Ao mesmo tempo Lula não diz uma palavra sobre reverter as privatizações, as reformas e o teto de gastos. Isso só mostra o que viemos falando no Esquerda Diário há muito tempo: Lula se prepara para gerir a obra econômica do golpe, ou seja, um país de terra arrasada. Dessa forma, qualquer promessa sobre trazer dignidade ou “fazer o pobre caber no orçamento” é letra morta. Isso para não comentar o absurdo de Lula ressaltar a todo tempo a importância do “agronegócio”, hoje o setor mais ferrenhamente apoiador de Bolsonaro e que tem lucrado horrores na pandemia causando a fome que vemos hoje em nosso país.

Sobre os militares, criticou sua presença na política. No entanto, ressaltou a necessidade de umas Forças Armadas bem equipadas e fez questão de mostrar que durante seu governo teve uma boa relação com os militares, mesmo esses tendo dado várias declarações saudando a ditadura e se opondo frontalmente até mesmo a abertura dos arquivos na comissão da verdade. Frente aos questionamentos sobre a participação do Brasil operações de paz da ONU no Haiti, que promoveram generais bolsonaristas como Augusto Heleno e foram marcados por várias violações nos Direitos Humanos, Lula se esquivou.

A contracara dessa política de alianças com a direita é justamente garantir a passividade dos sindicatos que o PT dirige, assim como a CUT. Dessa forma, tal paralisia das centrais tem feito com que todos os ataques passem sem quase nenhuma luta, enquanto Lula se prepara para administrar a terra arrasada que irá sobrar após todos os ataques, e tenta se mostra o mais capaz de garantir a “paz social” à burguesia.

Pois bem. Nós do MRT e do Esquerda Diários fomos linha de frente da luta contra o golpe institucional e a prisão de Lula, sem prestar nenhum apoio político ao PT. Por isso que, diferente de Lula, nós não perdoamos os golpistas. Pelo contrário, nós achamos que é necessário enfrentar não apenas a extrema direita bolsonarista mas também toda a direita golpista e neoliberal que é fiadora de todos os ataques, lutando para reverter toda a obra do golpe. E isso só pode ser feito através das mobilizações, sendo necessário que as centrais sindicais e entidades estudantis rompam essa política de paralisia que só fortalece a direita. Junto a isso, é necessário discutir uma saída política que se enfrente a todo esse regime apodrecido, levantando a necessidade uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana.

Essa assembleia seria em base à dissolução do atual Congresso reacionário que sustenta Bolsonaro, assim como também da própria Presidência, com poderes soberanos sobre todas as instituições do regime político e mudaria todo o sistema político e judiciário. Seria conformada por novos representantes do povo eleitos por bairros pelo país, que poderiam ser 1 para cada 100 mil eleitores, conformando uma grande assembleia com 2100 representantes de todo o país. Qualquer trabalhador ou jovem poderia se candidatar sem ter que ser filiado a partido. Estes representantes deveriam ganhar o salário de uma professora e serem revogáveis pelos seus eleitores se não cumprem com a defesa da população. Ser livre e soberana quer dizer que não tenha os limites que teve a de 1988, que foi tutelada pelos militares e muitos direitos que estão no papel nunca viraram realidade. Uma assembleia que pudesse revogar todas as reformas e o teto de gastos assim como reverter as privatizações. Além disso poderia debater medidas para enfrentar os problemas mais candentes do país como a fome e o desemprego. A luta por uma assembleia assim, que enfrentasse diretamente os interesses do imperialismo e da burguesia nacional, poderia abrir espaço para um governo de trabalhadores de ruptura com o capitalismo




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