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A 43 ANOS DO GOLPE DE ESTADO NO CHILE | Unidade Popular, Cordões Industriais e o golpe de Estado

No dia 11 de setembro de 1973, as Forças Armadas do Chile, comandadas por Augusto Pinochet, bombardearam o Palácio da Moeda, a sede presidencial do Chile. Tomaram por assalto as principais dependências do poder estatal, assim como as fábricas, bairros populares e centros de estudo.

Isabel Infanta@isabel_infanta

domingo 10 de setembro de 2017 | Edição do dia

Este sangrento golpe de Estado foi organizado pelas patronais chilenas junto à embaixada norte-americana e às Forças Armadas, com o objetivo de interromper o processo revolucionário que acontecia entre os trabalhadores. Este processo foi o mais profundo dentro do grande ascenso operário e popular dos anos 70 no Cone Sul, do qual os trabalhadores argentinos também foram parte.

Este ascenso de massas foi expressão do enorme descontentamento social que existia pelo adiamento indefinido das demandas mais sentidas da população. O governo da Democracia Cristã (DC) nos anos 60 tinha deixado sem solução demandas fundamentais, como a nacionalização do cobre, recurso chave da economia do país, a reforma agrária e o problema da moradia.

Este descontentamento se traduziu em greves, paralisações e tomadas de terras, e com o avanço na organização e experiência das massas, foi crescendo a ideia de que para vencer a patronal era preciso tirar dela o poder político.

A estratégia política da Unidade Popular

Os trabalhadores se ligaram sobretudo aos dois grandes partidos tradicionais da esquerda chilena, o Partido Socialista (PS) e o Partido Comunista (PC). Estas eram organizações políticas reformistas, ou seja, organizavam os trabalhadores mas não para lutar por sua independência política no caminho da tomada do poder, senão que para subordiná-los a acordos com a burguesia nacional, com um programa de reformas limitadas dentro do capitalismo.

Surge assim a Unidade Popular, coalizão entre o PS de Salvador Allende e o PC, com o pequeno Partido Radical, clássico representante da burguesia liberal, entre outras organizações menores. A maior parte das organizações de esquerda foram parte da Unidade Popular. O Movimento da Esquerda Revolucionária (MIR) foi a principal corrente que não o fez, oscilando entre o chamado às massas e o apoio a Allende, “pressionando desde fora”.

Se bem a UP foi apresentada como a realização de uma inédita revolução na democracia, seu objetivo limitado era o fortalecimento de um Estado que maneje os recursos econômicos estratégicos e fomente o desenvolvimento de um “capitalismo nacional”, recuperando certa autonomia frente ao imperialismo norte-americano.

Esta estratégia chamada “via pacífica ao socialismo” supunha que os ricos e empresários renunciariam a sua propriedade e seus privilégios e que as Forças Armadas respeitariam a “democracia”.

O governo de Salvador Allende

A UP ganhou as eleições presidenciais de 1970, com um plano de medidas que incluía a nacionalização das minas de cobre, ferro e salitre que se encontravam nas mãos de empresas imperialistas, de alguns setores industriais e de grandes latifundiários.

O governo de Allende nacionalizou várias minas e fábricas, mas comprando ações ou indenizando os patrões, avançou só parcialmente no controle estatal do comércio exterior, a nacionalização do sistema bancário se limitou à compra de ações de bancos privados, a reforma agrária entregou terras mas respeitou a burguesia agrária e assim sucessivamente.

As reformas de Allende não foram suficientes ou não permitiram avançar a uma ruptura com o imperialismo, a divisão da terra em uma reforma agrária radical, a liquidação do poder da burguesia, ainda que os irritava e os afetava.

1972: um ano fundamental

Este ano o projeto da UP começa a se desfazer. Os empresários alimentaram a crise econômica com a sabotagem e o desabastecimento. Surgem grupos fascistas como o Patria e Libertad, que faziam atentados, e setores burgueses e militares conspiravam abertamente, arrastando setores da classe média. A crise se agudizava com os lock out patronais, como o dos caminhoneiros, mostras da ofensiva direitista em meio a uma enorme polarização social.

Por baixo, os trabalhadores avançavam em um processo de ocupação e tomada de centenas de fábricas, e muitas começaram a funcionar sob controle operário. Foram organizados comitês de abastecimento e também os camponeses e a população sem teto ocupavam terras e se organizavam.

Até meados do ano, os trabalhadores começaram a coordenar zonalmente suas lutas, superando a direção da CUT. Surgem assim os Cordões Industriais, uma forma de organização muito avançada, embriões de poder operário e popular, que permitia a unidade de ação da classe operária sobre a base da deliberação e tomada de decisões democrática nas bases.

A coordenação entre dezenas de fábricas e locais de trabalho também permitia resolver questões relacionadas com a produção e distribuição de insumos e produtos surgidas do próprio controle operário. Começaram a se desenvolver elementos de armamento operário como forma de defesa das posições conquistadas.

Os trabalhadores passaram a exigir do governo a passagem das fábricas e locais de trabalho à órbita estatal, questionando a propriedade privada dos capitalistas. Em suas assembleias se dizia que para seguir avançando era preciso dar cheque mate nos patrões, e suas organizações davam passos em mostrarem-se como alternativa ao poder do Estado patronal.

Nestas discussões, os trabalhadores se chocavam abertamente com os dirigentes do PC, que justificava a devolução de empresas a seus velhos proprietários, apoiava a lei que permitia aos militares revistar fábricas em busca de armas, e deu aval à nomeação de Pinochet como Chefe do Exército, às portas de um golpe que já se via a caminho.

A negociação com os partidos patronais no parlamento burguês, majoritariamente a Democracia Cristã, assim como os acordos com o Alto Mando “institucionalista” das Forças Armadas, respeitando a constituição e as instituições do estado burguês, encerrou o processo de mudança social na redoma da democracia burguesa.

O desenrolar do golpe

O medo dos patrões frente o impulso das massas e a constatação de que o governo de Allende já não era capaz de conter, acelerou os preparativos golpistas. Sob a orientação de empresas imperialistas como a ITT e a aberta intervenção de Washington, foram homogeneizando as Forças Armadas para o golpe, isolando e reprimindo os setores resistentes.

Uma primeira tentativa, o “Tanquetazo” de junho de 1973, fracassou. Apesar da advertência, Allende, o PS e o PC chamaram as massas a confiarem na solidez da democracia chilena, no profissionalismo dos militares. Não somente se negaram a armar os trabalhadores, que pediam abertamente as ferramentas para enfrentar o golpe no seu início, senão que impulsionaram revistas nas fábricas para desarmá-los.

Desorientados e desmobilizados por seus próprios partidos e pela CUT, os trabalhadores não puderam preparar-se. Apesar de alguns contatos de resistência, o golpe de 11 de setembro encontra a classe trabalhadora e as massas impotentes e desarmadas. A ditadura de Augusto Pinochet se impôs durante 17 sangrentos anos, nos quais a burguesia restaurou seu domínio sobre os pilares do neoliberalismo em ascensão.




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