×

Reforma Trabalhista | Ministro do Trabalho reafirma: "Não vai ter revogaço"

Em entrevista para o site Jota.Info o Ministro do Trabalho, Luiz Marinho, reafirmou o compromisso da plataforma do governo de Frente Ampla em não revogar a reforma trabalhista. Conforme essa coluna vem apurando desde o início do novo mandato a revisão da legislação trabalhista segue fundamentada pela preservação do capital financeiro, combinada com a reconstrução do pacto entre o Estado e a estrutura sindical, a partir de um novo tipo de imposto respaldadalo pelo STF.

Felipe GuarnieriDiretor do Sindicato dos Metroviarios de SP

segunda-feira 24 de julho de 2023 | Edição do dia

A reforma trabalhista foi um dos objetivos centrais para a fração dominante da burguesia (setores ligados ao capital financeiro) apoiar o golpe institucional em 2016. Sendo os ministros do STF antessala do ataque legitimando o caráter jurídico dessa medida.

Como expressão distorcida desse processo, no sentido de não ser o representante orgânico dessa fração da classe dominante, o bolsonarismo ascendeu ao governo e aprofundou os ataques com a aprovação da Reforma da Previdência.

Ao contrario do que afirmava o pressuposto neoliberal, do qual Paulo Guedes foi o principal interlocutor - de que as reformas gerariam mais empregos, pois livraria o empregador de encargos - o desemprego na realidade atingiu patamares recordes. E os trabalhadores passaram a trabalhar em condições mais precárias, por mais tempo e com menos direitos, com aumento da informalidade e da chamada uberização do trabalho.

O governo de extrema direita de Bolsonaro representou uma tentativa de ruptura pela direita da estrutura sindical vigente desde a Era Vargas, cujo objetivo era acelerar os objetivos do capital imperialista, simbolizado pela devoção do Clã Bolsonaro a Trump. Contudo, esse projeto possuiu limites. Apesar do enfraquecimento, o regime sindical integrado ao Estado Capitalista prevaleceu, ainda que mais deteriorado. O que aconteceu foi a ruptura do pacto com a burocracia sindical. Ou seja, a ausência de mediações na relação entre capital-trabalho para impor os interesses dominantes.

Reforma Sindical deve ser apresentada após consolidação do Arcabouço Fiscal

As alianças realizadas pelo governo eleito de Lula-Alckmin representou, portanto, a reconstrução dessas mediações sob a ótica e os interesses da República da Faria Lima. O ministério do Trabalho coordenado por Luiz Marinho, ex-presidente da CUT e que já esteve a frente da pasta no governo anterior de Lula, atribuiu-se de assumir essa tarefa. Desde seu discurso de posse até o presente momento com os GT’s (Grupos de Trabalho) entre governo, empresários e as centrais sindicais (todas com exceção da CSP- Conlutas), Marinho quer formar um novo pacto sindical.

Nele, os principais pontos defendidos pelas centrais tratam da ultratividade, do fortalecimento das negociações coletivas, da restrição de terceirização e, em particular, do retorno do imposto sindical. Essa reforma sindical ganhou fôlego em abril com a mudança de entendimento sinalizada pelo STF, a partir dos ministros Gilmar Mendes e Luís Barroso, acerca da contribuição assistencial obrigatória.

A previsão para que os GTs elaborem uma proposta de reforma sindical é agora no final de julho. Entretanto, o momento exato será determinado pela consolidação do Arcabouço Fiscal, atualmente em tramitação para ser aprovado no Congresso Nacional. O projeto chefiado por Haddad, e articulado na Câmara junto com Artur Lira, vem apresentando uma conquista importante para o governo, no que diz respeito a estabilidade burguesa.

Trata-se de uma lógica muito simples. Primeiro, garante-se os interesses neoliberais com o limite de gastos nos serviços públicos, o pagamento da divida pública e a agenda de privatizações, cujos principais beneficiários são os bancos e os fundos de investimento. Para, posteriormente, construir com os empresários um novo pacto social, garantindo o fortalecimento da estrutura sindical (debilitada nos últimos anos).

Ainda que esse processo não esteja 100% finalizado, os últimos meses aceleraram o seu desfecho. Por um lado, pela sinalização positiva do mercado e das agências financeiras ao relatório de Haddad, assim como a devolução para julgamento da contribuição assistencial no STF, após o pedido de vistas de Alexandre de Moraes.

De outro lado, pelo aspecto das principais centrais sindicais envolvidas na negociação CUT, Força Sindical e UGT aceitarem a aprovação do Arcabouço do governo em completa paralisia, sem nem convocar ao menos 1 dia de luta. Vale destacar também, que centrais menores como CTB e CSB, e até mesmo a Intersindical (dirigida pelo Psol), apesar de não estarem no mesmo nível de protagonismo nas negociações, confluem com os eixos centrais do pacto e atuam com a mesma prática política.

Diante dessas considerações iniciais, analisemos, assim, os principais pontos abordados na entrevista pelo Ministro.

Imposto volta, reformas ficam!

"A opção foi sair da história que muitos desejavam, de fazer um revogaço puro e simples, por canetaço."

Para além do recurso retórico como se o Ministro estivesse se enfrentando com poderosos inimigos do capital. Quando na verdade está se referindo a reivindicação central de todas as greves e lutas da classe trabalhadora de 2017 para cá. Nada mudou substancialmente no conteúdo.

Lula, desde antes das eleições, já havia dito que não cogitava revogar as reformas. Na época o PT reivindicou muito o "exemplo espanhol" do governo de coalizão reformista, do PSOE ( Partido Socialista Operario Espanhol) junto com o PODEMOS, que adotaram a agenda revisionista. Gleisi Hoffmam que bradava "Precisamos fazer isso no Brasil", agora, na recém vitoria eleitoral do PP (direita tradicional), pouco falou da experiência hispânica. Mesmo que as eleições do Estado Espanhol sigam indefinidas, pois a aliança com o VOX (extrema direita) não atingiu maioria, demonstra-se como o caminho da conciliação, tanto lá como cá, só levará a um destino: o fortalecimento das forças de direita.

As centrais abrirem mão da revogação da reforma, evidentemente, possui uma contrapartida financeira. O custeio dos privilégios da burocracia sindical. A dialética reside na seguinte dinâmica. Se o enfraquecimento financeiro dos sindicatos foi determinante para acelerar ataques a classe trabalhadora; o retorno do financiamento, por intermédio do Estado, não corresponde ao contrário. Ou seja, não favorece a luta dos trabalhadores, o principal método de se obter conquistas.

Por 2 razões centrais. 1- essa relação de tutela dos sindicatos com as instituições do regime neutralizam o caráter estratégico da luta de classes; e 2- esse montante arrecadado financia os privilégios da burocracia sindical, encastelando dirigentes sindicais comprometido com os interesses dos patrões, e não dos trabalhadores.

Frações da burguesia ainda se incomodam com esse financiamento sindical, como expressou Ciro Nogueira, líder do PP, ao afirmar que "o ministro do Trabalho de Lula quer desfigurar a reforma trabalhista, recriar o imposto para aparelhar sindicatos". Por meio de uma visão pragmática, não gostariam do refortalecimento de mediações na relaçãoentre capital e trabalho. Entretanto, a prova de que não existe contradição para o estado capitalista está no próprio STF, que vai mudar seu entendimento, e está a prestar permitir o retorno do novo tipo de imposto sindical. O placar está em 6 X 0 e nas mãos da ministra Rosa Weber determinar a continuidade do julgamento.

Além disso, é sempre bom lembrar, que a traição da burocracia sindical na conjuntura pré revolucionaria aberta em 2017 com as paralisações nacionais e manifestação em Brasília contra a aprovação da reforma trabalhista, teve como pano de fundo a negociação, não concluída, com Rodrigo Maia sobre a manutenção do imposto sindical naquele momento.

Regulamentar as terceirizações irá por fim ao trabalho precário e escravo no Brasil?

"A terceirização é um item que deve ser visitado porque ela ficou ampla demais, liberou geral. Isso tem levado à fragmentação e à precariedade nas relações do trabalho, ao trabalho análogo à escravidão (...)o Supremo Tribunal Federal tem colaborado com essa visão, mas acho equivocado dizer que as terceirizações estão consagradas e podem ser feitas sem nenhuma responsabilidade (...)"

A fala de Marinho é uma meia-verdade. E como toda meia verdade esconde o real significado do processo de reestruturação produtiva neoliberal dos anos 90 até os dias de hoje. A definição "ela ficou ampla demais" pressupõe a legitimidade, no ponto de vista do governo, do trabalho precarizado. Afinal, o PT nos seus 13 anos de governo, administrou o neoliberalismo brasileiro, expandindo brutalmente a terceirização, com a criação de postos de trabalho com mais jornada, menos direito e baixos salários, e as privatizações com a criação do modelo de PPPs (Parceria Público Privadas).

A liberação irrestrita da terceirização corresponde a um momento anterior da reforma trabalhista. Trata-se da aprovação do Congresso Nacional da lei 13.429/2017. Fruto da revisão no Governo Temer do PL 4.302/98, arquivado durante 18 anos. Esse PL tratava da desregulamentação trabalho terceirizado e temporário, cujo intuito era flexibilizar as leis trabalhistas presentes na CLT aprofundando o avanço neoliberal. Em 2020 o STF promove, com voto favorável do ministro Alexandre de Moraes (escandalosamente reivindicado por setores da esquerda como defensor da democracia), o respaldo jurídico necessário para ampliar o trabalho terceirizado e temporário também nas atividades fins das empresas.

Cria-se, assim, uma falsa ideia de que o problema reside apenas no que a reforma trabalhista aprofundou, e não na estrutura de super exploração do trabalho que está por trás. Qualquer exemplo simples de privatização, demonstra como em última instância, não tem como ao longo do processo disassociar as atividades meio e fim, seja em relação a produção, ou na prestação de serviço.

Mesmo que o governo venha a revogar a Lei (o que não está garantido, já que Marinho condiciona isso a mudança de posicionamento do STF), a manutenção da reforma trabalhista segue aprofundando o trabalho informal, precário e temporario. Até a prometida regulamentação dos trabalhadores de aplicativo não foi cumprida, e no lugar disso, o STF recentemente já produziu jurisprudência. Que na prática leva à extinção da justiça do trabalho para esses setores ultra-precarizados da classe trabalhadora.

A ultratividade como parte de fortalecer a mesa nacional tripartite

"O grupo tripartite que trata do fortalecimento da negociação coletiva, junto com a questão do funcionamento sindical, está trabalhando com o compromisso de, até o fim de julho, me entregar uma formatação desse processo para que a gente transforme rapidamente em projeto de lei para encaminhar ao Congresso, com revisão de pontos da legislação trabalhista."

Outro ponto em revisão desde janeiro é a ultratividade, que deixou de ser prevista na CLT pela reforma trabalhista. Do ponto de vista dos trabalhadores é um tema contraditório. A ausência dela, por um lado, favorece a chantagem patronal nas negociações em categorias com bons ACTs, maior nível de organização e margem de manobra. Por outro lado, o retorno dela, não necessariamente favorece categorias com ACTs precários, sem nível de organização, geralmente controlado pela burocracia sindical e pouca margem de manobra em relação a patronal.

Nesse último aspecto, que Marinho busca fortalecer o novo pacto sindical. Já que o retorno da ultratividade estaria combinado com o estabelecimento de um Conselho Sindical. Seria a evolução formalizada dos GTs que trabalham atualmente para apresentar um novo P.L. ao Congresso Nacional. O suposto fortalecimento das negociações coletivas, não seria outra coisa, senão o controle do Estado burguês no regime sindical. Estabelecendo, portanto, limites e parâmetro, do que seria legislado e negociado.

O arcabouço fiscal foi um primeiro teste realizado com sucesso por essa iniciativa. Cada um cumpriu sua parte. O governo propôs, a burocracia sindical aceitou e mediou a paz, e a Faria Lima aplaudiu.

Todos esses fatores demonstram como a participação dentro desse pacto impede concretamente o desenvolvimento da luta de classes. Já que é uma política de conciliação que absorve a agenda econômica da extrema direita. O caminho não possui atalhos e passa por construir oposições fortes e sindicatos independentes dos governos e patrões. Assim como exigir que as centrais sindicais rompam com esse pacto e chamem a construção de um plano de luta pela revogação das reformas e contra todos esses ataques.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias