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França, centro de gravidade da luta de classes mundial

Diana Assunção

André Barbieri

França, centro de gravidade da luta de classes mundial

Diana Assunção

André Barbieri

Há quase 3 meses, a França segue sendo um centro de gravidade da luta de classes mundial. O que isso significa? Que por um lado é desse país que emanam os principais embates de classe contra a tentativa dos capitalistas de descarregarem a crise sobre nossas costas, mas também é aí onde começa a surgir na vanguarda um pólo de auto-organização dos trabalhadores que quer superar os limites que impõem as burocracias sindicais. Neste artigo, buscaremos elencar alguns pontos centrais para seguir e aprender da experiência francesa.

As novas características do momento pré-revolucionário

A luta contra a reforma da previdência na França merece muita atenção. A França reúne ao redor de si as condições que Friedrich Engels considerava indispensáveis para qualificar um proletariado como a vanguarda de sua classe mundial. No prefácio de 1874 à Guerra Camponesa na Alemanha, Engels afirmava que, incorporando os ensinamentos das batalhas do sindicalismo inglês e das lutas sociais na França, em especial a então recente Comuna de Paris de 1871, “os operários alemães foram colocados provisoriamente na vanguarda da luta proletária”. Apesar de não termos vivido processos revolucionários recentes, e sim distintas revoltas nacionais ao redor do globo, os franceses passaram por um longo ciclo de luta de classes desde 2016 – luta contra a reforma trabalhista de Hollande, os Coletes Amarelos, a batalha contra a reforma da previdência e contra a privatização das ferrovias, a greve dos petroleiros de Grandpuits – que forjou lições para essa batalha contra a reforma da previdência de Macron. Mais uma vez os trabalhadores franceses estão hoje na vanguarda, e portanto a França é o centro de gravidade da luta de classes.

A atividade e a massividade dos protestos desde janeiro recebeu um impulso de radicalização com a aprovação pelo decreto 49.3 da reforma da previdência por parte de um Macron debilitado e isolado, que fugiu à China de Xi Jinping durante a última jornada de mobilização nacional do 6 de abril. Estamos em um momento pré-revolucionário com rumos indefinidos, e muitos cenários em aberto.

Depois do decreto do 49.3, a determinação da parte mais ativa da classe trabalhadora, que está em luta e tem o futuro do país em suas mãos, deu um salto. Como escreve Juan Chingo, três características qualificam o momento pré-revolucionário francês. O primeiro é a entrada em cena da radicalização do movimento, que até então se circunscrevia à massividade das jornadas de mobilização, ainda passivas, convocadas pelas centrais sindicais reunidas na Intersindical. Essa giletjaunização (ou radicalização) do movimento é mais importante agora do que no momento do fenômeno dos Coletes Amarelos, em 2018, que, por mais radicalizados que estivessem, não estavam conectados aos principais bastiões da classe trabalhadora com seus métodos próprios de greve e tampouco tinham tamanha massividade. E essa é justamente a segunda característica marcante do momento: as greves simultâneas em vários setores estratégicos, como as refinarias, os centros técnicos de transporte, nos centros de coleta e processamento de resíduos, nos centros de produção de energia elétrica, entre outros. Os trabalhadores em cólera começam a se separar, na ação, das manifestações calmas e pacíficas da Intersindical. A terceira característica é a participação maciça da juventude no movimento. Os jovens estudantes de colégios e universidades compreenderam, em muito maior medida que em 2019, que seu futuro está em jogo com a reforma da previdência, e encontraram um caminho comum de mobilização junto à classe trabalhadora, com elementos anticapitalistas mais marcantes que na ocasião da luta contra o Contrato de Primeiro Emprego (CPE) de Lionel Jospin em 2006.

É chave neste momento unificar a luta defensiva das massas trabalhadoras, ao mesmo tempo em que é necessário dar às massas a consciência de suas próprias forças para preparar a ofensiva contra Macron e o estado capitalista. Diante da ofensiva repressiva pelo Ministro do Interior, Gérald Darmanin, que questiona inclusive prerrogativas dos direitos humanos na França para atacar a vanguarda dos trabalhadores e da juventude, é necessário expandir ao máximo o escopo da mobilização, trazendo novas forças para a arena, e endurecer o combate contra o Estado unificando os métodos operários com as demandas mais sentidas pelas massas. A sustentação dos piquetes de greve é fundamental, uma vez que o isolamento de cada luta – operado conscientemente pela burocracia da Intersindical – é um fator que o Estado utiliza para fazer falsa propaganda (Macron provocou os manifestantes, em seu refúgio na China, dizendo que “as greves são fracas” e “a taxa de grevistas é a mais baixa em muito tempo”, sem explicar porque fugiu da França na jornada de paralisação nacional…). Lembremos que Macron chegou também à estapafúrdia comparação das manifestações massivas na França com os fracassados atos da extrema-direita no Brasil em 8 de janeiro.

Paralelamente à defesa dos grevistas, a revitalização do movimento depende da generalização da greve aos setores estratégicos, preparando a greve geral. Acima de tudo, retomar a greve para as mãos dos grevistas, colocando a auto-organização em primeiro plano, é uma condição sine qua non para avançar no questionamento do conjunto da reforma, do regime da V República e do Estado. Esse elemento da auto-organização vem sendo o ponto fraco da mobilização, e aquilo que permite à burocracia sindical preparar o desgaste e esfriamento do momento pré-revolucionário francês, que poderia incendiar o mundo se se convertesse numa situação abertamente revolucionária.

Burocracia sindical, um dos pilares de sustentação de Macron e da V República

Há já uma semana, a única preocupação da Intersindical (a coalizão de centrais sindicais envolvida na direção “oficial” do movimento, como a CFDT, a CGT, a FO, entre outras) foi fazer propostas ao governo para encontrar uma "saída para a crise". O encontro com a primeira-ministra Elizabeth Borne foi mais um ato diversionista da burocracia, que serve ao macronismo e quer evitar a qualquer custo a possibilidade de expandir as greves por categoria, e construir uma greve geral.

Com efeito, Laurent Berger, principal dirigente da Intersindical, revelou explicitamente o que pensa ao canal BFMTV. Logo depois do encontro com o governo em Matignon, Berger disse que “talvez não haja saída e essa lei seja promulgada e aplicada [...] se você me perguntar se haverá uma manifestação por semana daqui a seis meses, a resposta é não”. Em seguida, acrescentou que “não existe possibilidade de contestar a legitimidade do Conselho Constitucional”, órgão do Estado que avalizará a reforma da previdência passada por decreto. Essa é a lápide na estratégia derrotista da Intersindical, que já se havia oposto a qualquer vestígio de auto-organização, à demanda da greve geral, e inclusive se calou até agora sobre as requisições policiais obrigando grevistas a trabalhar. Diante disso, setores da esquerda brasileira se embaraçam em saudações à importância da “unidade do aparato da Intersindical” que serve de freio de contenção à derrubada dos planos da burguesia francesa.

Ao tratar do tema, o filósofo italiano Maurizio Lazzarato afirma que os diversos movimentos sociais franceses, nessa batalha contra a reforma da previdência, “se inseriram na mobilização sindical, dando a ela outra margem e substância: o do desafio ao poder e ao capital”. A verdade é mais complexa. Com efeito, podemos postular o princípio oposto. Ainda que os movimentos sociais sejam partícipes das jornadas de manifestação, o papel da burocracia da Intersindical foi separar as demandas dos trabalhadores das demandas dos movimentos de mulheres, ambiental, imigrante e contra a violência racista. A burocracia sindical da CFDT, da CGT e demais centrais proibiu que o programa das mobilizações contivesse algo mais do que a já limitada consigna de retirada da reforma, bloqueando a necessária integração das demandas salariais, contra a precarização do trabalho, contra a destruição ambiental, o repúdio à militarização e à repressão contra os negros e imigrantes, etc. Ao contrário do que postula Lazzarato, essa divisão não oficia como fator operador de um “desafio ao poder e ao capital”. A contenção da ira social, e a divisão dos distintos segmentos da classe trabalhadora, e desta com os movimentos sociais, é um bloqueio à possibilidade de hegemonia operária sobre seus aliados fundamentais.

Como “desafiar o poder” se se renuncia à batalha em meio ao exercício de heroísmo por parte dos trabalhadores franceses, como fazem Berger e a Intersindical? Até aqui, ao menos no período anterior à aprovação por decreto da reforma, as burocracias sindicais, encabeçadas por Laurent Berger da CFDT e por Philippe Martínez da CGT, propunham levantar exclusivamente a demanda limitada da retirada da reforma da previdência. Renunciavam a acrescentar as reivindicações mais sentidas pela massa trabalhadora precária (como aumento salarial e a abolição da precarização do trabalho). O objetivo era cindir o movimento operário e desligar seus setores com mais direitos daquelas demandas dos setores oprimidos. Depois da aplicação do decreto 49.3, em que a radicalização tomou as ruas francesas contra o governo, Berger já não fala de "retirada" da reforma, mas sim de "pausa" ou "suspensão". Trata-se de uma traição aberta ao movimento, não apenas de “não compreensão” das novas características do movimento, como sugere Lazzarato, muito menos que a reformista La France Insoumise represente uma alternativa à burocracia, quando opera essa mesma divisão no terreno parlamentar. Essa linha de oxigênio a Macron foi dada junto com a política consciente de isolar cada piquete de greve "selvagem" [1], e pelo cansaço ou repressão, deixar cada greve ser derrotada em separado. Como se não bastasse, a Intersindical se recusa a denunciar a enorme violência policial movida por Macron que, debilitado e isolado, busca quebrar a vontade de lutar com as armas, bombas e cassetetes da polícia.

Portanto, o que existe para ser discutido com Elizabeth Borne quando Macron se recusa a mover a mínima vírgula na sua proposta de lei? Qual o motivo de um encontro com os funcionários de um governo debilitado que estão quebrando greves com a repressão dos setores chave do movimento operário? De que serve o “diálogo” com um governo que incrementa a repressão ao movimento estudantil, invadindo universidades, espancando e prendendo estudantes para evitar sua unificação com o movimento operário?

Berger, Martínez e a Intersindical preferem a passagem da reforma da previdência do que o aprofundamento da auto-organização e radicalização do movimento de massas. Não querem desestabilizar o governo e o regime, e sim preservá-los junto aos privilégios materiais de que gozam sob os efeitos da estatização dos sindicatos. São um dos principais pilares de sustentação de Macron e do regime político da V República, e um obstáculo crucial ao momento pré-revolucionário que vive a França na maior crise política dos seus últimos trinta anos.

Rede pela Greve Geral, Comitês de Ação e a auto-organização: é possível vencer Macron

Diante deste novo momento pré-revolucionário e do papel de contenção da burocracia sindical francesa à diferença de outros países onde vimos revoltas, rebeliões e greves massivas é a existência na vanguarda de um polo pela auto-organização dos trabalhadores. Longe de se tratar de um detalhe ou de uma “característica francesa”, aqui estamos falando de um elemento que teria o poder de, se assumido por amplos setores de massas, mudar a correlação de forças a favor do movimento e inclusive vencer essa batalha contra Macron. Em geral, a esquerda institucional odeia a auto-organização porque vai contra os acordos de cúpulas, os calendários pré-definidos e a estabilidade das burocracias partidárias e sindicais. Mas há também os setores da esquerda centrista que falam de auto-organização de forma abstrata: ou transformando em um slogan vazio que nunca se concretiza ou transformando em algo saudosista dos sovietes na Revolução Russa, como algo apenas do passado ou de momentos diretamente revolucionários, esvaziando o sentido que a estratégia soviética permite trazer aos dias atuais.

Ocorre que na França estamos diante de um exemplo bastante concreto. Por iniciativa dos trotskistas do grupo Révolution Permanente, organização-irmã do MRT, e diversos dirigentes sindicais, colocou-se de pé uma Rede pela Greve Geral. Imaginemos que, mesmo diante de greves massivas, como estamos acompanhando, a burocracia está atuando para que essas greves não se tornem “renováveis”, mas sim manter um calendário de dias de luta mais espaçados que permitam dar fôlego ao governo. Então, quando algumas centenas de dirigentes sindicais, referentes políticos, artistas e intelectuais se unificam em uma “rede” que organiza atos quase que semanais para discutir uma estratégia para vencer, vemos um tipo de atuação completamente distinto da burocracia sindical. Enquanto a burocracia sindical não organiza instâncias que unifiquem distintos setores e dê voz aos trabalhadores, a Rede busca chegar a setores cada vez mais amplos pensando ações concretas de unidade, como foi o impressionante piquete na refinaria Total na região da Normandia, em Havre. Algumas centenas de pessoas viajaram de Paris para impedir a repressão, e, combinado a essa atuação, os advogados ligados ao movimento, como Elsa Marcel, entraram com uma petição contrária aos ataques ao direito de greve, petição essa que obteve vitória nos últimos dias.

A Rede pela Greve Geral busca aparecer claramente separada das burocracias sindicais, mas exigindo que elas se movimentem e parem de atuar com essa política de suspensão e trégua, mas que permitam o desenvolvimento do profundo processo que está ocorrendo na França neste momento. Para desenvolver essa política por uma greve geral renovável, que siga até vencer, seria fundamental colocar de pé Comitês de Ação pela Greve Geral, o que seria isso? Seria uma extensão da articulação já feita pela Rede mas muito mais conectada com cada local de trabalho e estudo, atuando de forma auxiliar à batalha pela frente única operária, defendendo e batalhando em cada local de trabalho pela defesa da greve geral, se auto-organizando, ou seja, permitindo a auto-atividade dos trabalhadores e estudantes em suas próprias instâncias de base, decidindo os rumos da luta e não esperando os calendários e negociações vazias da burocracia sindical.

Ou seja, muito longe da abstração ou de algo do passado, a auto-organização é uma das chaves centrais do conflito hoje na França e que esse movimento de vanguarda ganhe peso de massas poderia ser um elemento decisivo para vencer Macron. Os limites que estão impostos são, por um lado, a política das burocracias sindicais que sempre atuam para bloquear e esmagar qualquer iniciativa que saia do seu script, mas também pelas correntes da esquerda que fogem como da peste da auto-organização. Esta é uma das chaves da emergência da nova organização revolucionária na França, o Révolution Permanente, que, como apontou Matias Maiello em artigo recente se insere nesse contexto: “o primeiro passo para que re-emerja uma nova esquerda revolucionária é uma ruptura com a concepção da política como sinônimo de integração ao Estado e as formas em que este ‘organiza’ o consenso ativo das massas”.

A política da extrema esquerda: por que é importante para o Brasil?

É natural que diante desta situação na França as correntes brasileiras que vangloriam o NPA estejam perdidas diante da emergência de uma nova organização revolucionária na França. Para quem fala de auto-organização como uma palavra ao vento é de fato difícil ter de aceitar que há revolucionários na França colocando de pé uma Rede pela Greve Geral e batalhando por Comitês de Ação, algo por exemplo impensável para um partido como o PSOL que transforma a atuação no parlamento como um fim em si mesmo para integrar um governo de frente-ampla cheio de empresários. A “luta” quando existe se trata de algo “externo” ao partido, no qual o partido vai de mãos dadas com as burocracias parabenizar algumas lutas, mas não como parte constitutiva de construir uma estratégia que possa desmantelar a engrenagem burocrática das direções sindicais atreladas ao governo que querem suspender e entregar a luta, são justamente estas direções que atuam como verdadeiras polícias da burguesia no movimento operário, como dizia Trótski. Sem enfrentar isso, não é possível lutar pela frente única operária, lutando para que essas direções unifiquem a classe trabalhadora com o desenvolvimento da auto-organização.

É por isso que na última semana vimos algumas correntes do PSOL como o MES e a Resistência tentando falar algo sobre a França escondendo ou atacando a emergência da extrema-esquerda que é reconhecida por inúmeros meios de comunicação. O MES optou por silenciar sobre a burocracia sindical e soprar o trompete do NPA, partido abertamente em crise diante dos novos engendros neo-reformistas na França. Já a Resistência, perdida desde então e tentando se encontrar, decidiu publicar um artigo de um setor da ala mais burocrática do NPA, mostrando seu desespero em “criticar” o Révolution Permanente por “lutar demais pela greve geral” e “dividir o movimento”. A Resistência trabalha como mero eco das tendências mais burocráticas que buscam impedir o desenvolvimento do movimento contra a reforma da previdência, chegando ao ponto de transmitir à extrema esquerda o papel da burocracia (dividir o movimento), enquanto Berger admite a legitimidade do governo.

Entretanto, o MES também se apoia na direção reformista do NPA, que saúda o papel da burocracia sindical, como é o caso de Ugo Palheta (cujo artigo no Contretemps publicam em seu site), segundo o qual o problema não é a Intersindical e sim a suposta falta de vontade das massas em se auto-organizar (sic), sendo um dos pontos mais fortes do movimento a "unidade da frente sindical, sem a qual é duvidoso que o movimento tivesse conquistado tamanha amplitude e colhido tamanho acatamento na população". Duas maneiras de colaborar com o adversário, contra o que há de mais avançado no movimento. O que ambos os artigos têm em comum? O apoio à burocracia sindical que odeia as greves e a auto-organização, e ao reformismo do La France Insoumise de Mélenchon, que busca passivizar o movimento de massas usando o terreno parlamentar. Mas mais importante é que nenhuma dessas correntes (Resistência ou o MES) possui qualquer trabalho na França. Não tem muito do que falar, apenas podem fazer saudações abstratas à luta ou alentar as experiências que estejam distantes da auto-organização real dos trabalhadores, e sufocar sua própria falência com “críticas” ao Révolution Permanente usando as opiniões do fracassado NPA.

Enquanto esses artigos com poucas visualizações estampam tristemente o site dessas organizações, tão apartadas da luta de classes, vemos que a estratégia de se jogar efetivamente na auto-organização da classe trabalhadora - a partir de teorizar sobre últimos processos de luta de classes internacional que voltam a colocar a problemática de como passar da mobilização à revolução -, é o único caminho para construir uma força revolucionária consistente que seja embrião de um partido revolucionário na França. E essa emergência da extrema-esquerda na França é retratada até mesmo nos meios de comunicação, em meio à crise do NPA e da paralisia da Lutte Ouvrière, as duas organizações tradicionais desse espaço político. Assim o reconhecem personalidades do jornalismo, como Abel Mestre, editor político do Le Monde, para quem “Neste movimento, a exposição do Révolution Permanente e de suas organizações satélites (por exemplo, Le Poing Levé) é verdadeiramente impressionante em relação ao peso desta corrente. O RP aproveita o vácuo deixado por uma Unef moribunda [velha organização estudantil dirigida pelo PCF, NdT] e um NPA em crise”. É o caso de Sylvia Zappi, também do Le Monde, para quem “é impressionante como o RP encabeça uma grande parte das colunas de jovens nas manifestações”, e de Marceau Taburet, do jornal Libération, para quem o RP, nesse movimento, “já conquistou um lugar de direito”.

A postura acrítica da esquerda brasileira, especialmente vinculada ao PSOL, diante do que está em jogo na França tem consequências importantes. A inadequação dessa postura é evidente se examinamos os desafios no Brasil diante de um governo de conciliação de classes, o governo Lula-Alckmin, que engloba em seu interior não apenas as principais centrais sindicais do país, mas o próprio PSOL (que possui Sônia Guajajara no Ministério dos Povos Indígenas, e a vice-presidência do governo na Câmara dos Deputados). Saber tirar lições dos acontecimentos franceses implica preparar uma grande batalha para recuperar nossos sindicatos das mãos das burocracias - tentáculos do Estado que organizam a hegemonia burguesa no interior do movimento de massas. As direções da CUT, Força Sindical, UGT, CTB, são expressão da estatização das organizações sindicais no Brasil, cujo papel é aprofundar a fragmentação e a divisão entre os oprimidos. Existem para cumprir, à sua maneira e com as características particulares do Brasil, o que a CFDT e a CGT estão fazendo com o poderoso movimento francês. A batalha por superar essas direções e sua influência antirrevolucionária na França deve reverberar na esquerda brasileira. Da mesma forma, a consciência de despertar a maior desconfiança contra engendros reformistas como La France Insoumise. A necessária independência do governo Lula-Alckmin tem a sua dimensão nas nossas organizações de massas, e isso precisa ser preparado com antecedência, semeando as ideias da auto-organização e de um programa transicional para os momentos agudos da luta de classes. Se a esquerda for incapaz disso, tanto pior para ela.

Por isso, mais do que nunca, devemos não somente acompanhar a apaixonante situação de luta de classes na França, mas debater quais são as estratégias para vencer e a importante novidade da emergência da extrema-esquerda neste país.


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FOOTNOTES

[1É como se denomina uma greve realizada por fora do controle das direções sindicais.
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Diana Assunção

São Paulo | @dianaassuncaoED

André Barbieri

São Paulo | @AcierAndy
Cientista político, doutorando pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), é editor do Esquerda Diário e do Ideias de Esquerda, autor de estudos sobre China e política internacional.
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